11 setembro 2006

Metamorfose

A desilusão possui-me.
Sejam abertas as hostilidades.
Retalhos de realidades absurdas e absortas dominam agora o ecrã.
Como desenhos animados na impenetrável mente infantil, na demente mente envelhecida.
Há que sobreviver. (Re)criar. Libertar.
Gritar.

Expelir de mim os restos amontoados de uma vida cobarde e neutra.
Agora já não posso voltar atrás.
A catarse que escolhi matou o meu eu anteriormente escolhido. Anteriormente desejado.
Mas agora já não.
Um novo momento chegou a si. A mim.
Invariavelmente certeiro e abrasivo, estou de novo na estrada. E aqui esperarei. Consumindo(-me) até que a fonte seque.

E seca.
Daí a inexplicável envolvência gerada pela constante constatação de realidades absurdas e seus absortos habitantes.
E é nesta amálgama sem piedade que coexistimos. Eu e eles. Embora eu sempre clame estar à margem. Numa margem que permita que não me afogue por entre o lodo incandescente que jaz no fundo do poço.
A esperança de que tal aconteça é tanto ou mais longa e resistente que o poço onde me encontro. Onde nos encontramos.
Ainda assim, a decisão foi tomada. Correcta, incorrecta, tanto faz. Já não me pertence.
Nesta fase sem alma, já tenho tudo o que desejei.
Já sou, neste exacto segundo, eu.
Novamente.
A metamorfose é um mal necessário.
Sinto-me também mais leve. Como que oscilatoriamente revolvido em mim.
Agora já posso lutar.
Mas as causas que sempre defendi não sei onde estão, onde as guardei.
Talvez um dia as encontre.
Talvez esse dia me traga novas surpresas.
Por enquanto, vou simplesmente esperar.
Como até aqui.
Após tanto esforço por um objectivo sentido, já não tenho forças para mudar o mundo.


Pintura: "A Espera" de Judith Kaplan (2001)

1 comentário:

  1. "a metamorfose é um mal necessário"
    sem duvida.. gostei muito =)
    continua **

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