05 outubro 2006

Ser ou não ser:
Eis a Utopia (II)

Sejamos sinceros.
Ser-nos-á tão agradável assim, atravessar diariamente um cruzamento povoado por “visitantes” de Leste? Ter de partilhar a fila de autocarro com um jovem de aspecto “peculiar”? Receber ordens de uma chefe? Ou o mais antigo dos focos, ser atendido num qualquer estabelecimento por um funcionário negro?
São inumeráveis os pontos de ruptura entre a sociedade e os seus habitantes.
Claro que nos é completamente indiferente ver um rapaz com umas calças que nunca tenhamos imaginado possíveis de existir. Afinal, cada um veste-se como quer. Mas isso não impede que fiquemos “ofuscados” por essa marca de diferença.
Ou ver alguém de mãos nos bolsos e de carapuço na cabeça. Por muito frio que esteja, não conseguimos evitar olhá-lo de lado.

É a nossa natureza.

O medo do desconhecido (ou o medo do que não queremos conhecer) é intrínseco à raça humana.
Raça humana. A totalidade.
Não deveria esta ser a única condicionante das relações sociais?
Claro que sim. E ninguém, pelo menos abertamente, se recusa a ser atendido por um funcionário negro. Está na moda não ser racista e temos de manter as aparências.
Aqui temos (mais) uma bifurcação de conceitos. Os preconceituosos deverão ou não assumir-se como tal? O confronto de realidades. “Devemos assumir-nos como aquilo que somos” vs. “Não devemos ser preconceituosos”.

E o vencedor é… a (in)consciência pessoal.

Indubitavelmente.
Só nós podemos decidir como queremos actuar. Se é que queremos, de facto, actuar.
Se temos a noção do que é correcto, necessariamente agiremos de acordo com ela. Já dizia Sócrates. O que nos leva a concluir que, tão injusto quanto o mundo em que vivemos, é o debate sobre este tipo de questões. Assim, constatamos que ninguém faz nada por mal. Analogamente, “de boas intenções está o Inferno cheio”. Quando a filosofia grega se opõe à sabedoria popular, a questão torna-se tão complicada quanto possa parecer.
E, no entanto, tão simples. Tão resumida. Tão breve.
É apenas realmente necessário ter perspicácia e poder de observação suficientes.

1 comentário:

  1. bem estava aqui de passagem e acredita que surpreendeste com este post fiquei colado, dá que pensar sem dúvida.
    bem, antes de mais, quero dar os parabéns pelos magnificos pensamentos, mas a razão pela qual tou a escrever é que de facto não existirá qualquer utopia neste mundo. em primeiro lugar não se pode agradar a todos. utopia para nós desgraça para outros, tal como o facto de sermos atendidos por um individuo de raça negra. com certeza muitos se sentem incomodados com isso, mas tbem não me parece que alguem goste de se sujeitar a um emprego mais baixo ou mais humilhante, quem sabe, apenas porque nao lhe deram mais nenhuma hipotese de ser bem sucedido só pelo facto de o azarado do rapaz ter nascido negro. ah e como se nao bastasse ainda tem de aguentar um olhar desconfiado e de desprezo, da parte do presunçoso que só porqu está a pagar um serviço se acha mil vezes melhor.
    em segundo lugar acho que o problema que se devia por em causa realmente é até que ponto é que pensamos no assunto, e até que ponto é que realmente nao somos racistas. todos se mostram tolerante mas o problema é que até aqueles que mais se disponiblizam para ajudar ou para fazer a diferença, tem no seu subconsciente uma reacçao de auto defesa. e é então que todos ficamos na primeira fila a ver alguem ser discriminado e mal tratado em vez de corrermos um risco, inexistente, e sentirmo-nos bem por termos marcado a diferença. por isso, e infelizmente te digo que tens toda a razao. e poderia continuar aqui a escrever que este assunto tem muito que reflectir e muitos que criticar sem duvida.
    no fundo o que eu quero dizer é continua a vestir as tuas calças da faina e orgulha.te disso, porque o critico mais fraco, é aquele que nao consegue aceitar aquilo que o rodeia temendo uma teoria mais credivel que a dele.

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